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domingo, 9 de outubro de 2011

Lua de pólvora


Ela não queria permanecer ali, era sufocante. Ela sentia como se fossem lhe atirar em um buraco repleto de espinhos, como em Mortal Kombat, na sua cabeça os pensamentos predominantes “O que estou fazendo aqui?” “No que é que eu esta pensando afinal?” “Isso não pode dar certo!”.
O suor escorria por seu rosto como o sangue que escorre de um pequeno corte. Pequenas gotas que logo inundariam sua roupa deixando-a com mal cheiro e parecendo uma palhaça de maquiagem toda borrada. Mas ela não deveria importa-se com isso, haviam coisas mais importantes em jogo, coisas que decidiriam todo o seu futuro.
Nervosa e sem saber o que fazer com as mãos, que pendiam inertes ao lado de seu corpo, ela mirou-se no espelho para retocar a maquiagem, afinal ela precisava ficar calma, muito calma para fazer o que teria que fazer.
Seu rosto lhe parecia a face da morte, mesmo com toda a maquiagem que  usava. Ela quase sorriu ao imaginar uma foice como a da Morte em sua mão direita. Seus olhos castanhos amendoados eram como dardos, brilhantes em meio a toda a sombra acobreada, o lápis e o rímel; seus lábios, agora pintados de vermelho, encontravam-se entreabertos, pois ela não conseguia mais respirar normalmente, sua respiração estava totalmente descompassada. Seu cabelo ruivo, brilhava mais laranja que nunca na iluminação branca do banheiro.
Era agora ou nunca. Ela tinha que fazê-lo.
Era por esse momento que ela ansiara a vida toda, desde que tivera capacidade para compreender e suportar as coisas. Era a hora desse peso sair de suas costas, dela poder ser livre, coisa que nunca fora. A partir daquele momento ela poderia seguir sua vida, ser quem ela quisesse, e ter o que quisesse, ser dona de si mesma e de suas vontades sem que nada lhe pesasse na memória.
Era o seu momento, o apogeu de sua gloria, ela já aguentara demais pra desistir agora. Era agora ou nunca, e ela sabia. E por isso receava. Isso fora o objetivo de toda sua vida, foi isso que a fez ser quem era, essa sede incansável, essa sensação vermelha que lhe borbulhava o sangue.
Ela precisava fazê-lo para que se sentisse completa, era isso, era o que eles quereriam.
 E ela faria.
Renata vestiu seu robe vermelho sob a lingerie escarlate que ostentava, ela não queria vestir nada disso, mas praticamente fora obrigada por suas amigas, amigas essas que a partir de hoje a odiariam.  Era o preço, ela sempre soubera, só não imaginou que doeria tanto assim.
Ela lançou mais um olhar sob si no espelho antes de fechar o robe, seu espartilho vermelho era realmente belo, realçava todas as suas curvas de forma impressionante. A cinta que prendia a meia, assim como suas luvas eram vermelhas sangue, “vermelho sangue, que sugestivo” ela sorriu felinamente e saiu do banheiro com passos decididos, praticamente uma marcha, mas diferente da que realizara  poucas horas atrás, essa não era uma marcha nupcial.
Ele estava sentado na banqueta, arrumando o rádio, colocando a musica deles pra tocar, estava tão lindo, ela não pode deixar de pensar, e um arrepio correu por suas costas, como se dedos gelados e mortíferos a acariciassem, como um desafio.
Ela encaminhou-se até ele, parando a centímetros, estendeu suas mãos em direção de seus ombros largos e fortes, que ela tanto admirava e os acariciou. Ele virou-se e a encarou. Seus olhos azuis a penetravam, como adagas afiadas, pareciam ler sua mente, sua alma... Seu coração, mas era só ilusão, pois se ele soubesse, se ele ao menos imaginasse suas reais intenções não estaria ali agora, não com ela.
Esse pensamento a machucou mais do que ela imaginava, desencadeando  uma onda de sentimentos que ela não queria sentir, concentrando-se ela empurrou tudo para longe de sua mente, ela lidaria com isso depois, quando tudo estivesse findado.
Ela acariciou o rosto dele, decorando cada linha, assimilando cada contorno, de suas sobrancelhas arqueadas, passando por seus olhos azuis, por seu nariz meio torto, de um soco que levara na infância, até seus lábios cheios e bem desenhados, ela não queria esquecer aqueles traços, odiados, e ao mesmo tempo tão amados.
Ele pegou-a e a levou para a cama, acariciando-a lentamente, nunca tirando seus olhos dos dela. Renata sabia que não podia deixar-se levar, se o fizesse, estaria perdida, por isso, com o pretexto de despir-se do robe, ela levantou-se da cama e caminhou em direção ao local onde escondera sua surpresinha conjugal.
Ela pegou-a lentamente, sua mão nem ao menos tremia, ela sempre fora boa em controlar a emoção, não era agora que deixaria levar-se por elas.
Sentado calmamente ele a observava, a surpresa que ela esperava ver em seus olhos quando visse o objeto que ela portava não veio, e por um momento ela sentiu-se confusa e com medo.
Ela parecia uma deusa vingativa, sua pele branca contrastava quase dolorosamente com os trajes mínimos vermelhos, e a arma prateada em suas mãos, um 38, era pequeno, mas ninguém teria a ousadia de duvidar de sua potencia.
Ela apontou-a para o peito de seu marido com braços firmes e decididos, seus olhos perfuravam os dele, ela se preparava para puxar o gatilho “não pensarei” “não me darei esse luxo”, mas ela simplesmente não podia ficar sem saber, a curiosidade a corroía mais do que a culpa.
_Vejo que não está surpreso, por quê?
_Nenhum pouco. Vejo que ficou desapontada, esperava que eu fizesse uma cara de espanto, ou que chorasse por piedade Renata? – perguntou ele encarando-a, ainda na mesma posição.
_Como? – ela não tinha tempo para joguinhos, ela precisava terminar com isso já.
_Eu sempre soube quem você era, desde o primeiro momento em que a vi. Inclusive quando você fingiu tropeçar para que eu a segurasse, eu sabia qual era a sua intenção, mas eu queria ver até onde ia o seu jogo, até onde você iria para alcançar sua suposta vingança. Desde que começamos a sair eu dormia após o sexo pensando que talvez não acordaria mais. Mas confesso que com o tempo fui me perguntando “porque ela não faz nada?” eu passava horas tentando achar um porque, logo decidi que, talvez, você tivesse mudado de ideia. Porem no mês passado a vi saindo de uma loja de armas, nós já estávamos de casamento marcado, foi ai que entendi, o quebra-cabeça solucionou-se em minha mente, e eu pude ver o que você queria mais do que tudo, sacrificar meu coração junto com meu corpo, pois era o que aconteceria com o seu quando você finalmente colocasse seu plano em ação. Acho que você se apaixonou por mim no mesmo momento que eu, naquele dia na lanchonete, no nosso quinto encontro, lembra-se? Você estava comendo o lanche e fazendo a maior sujeira, eu estava rindo porque nunca havia visto uma mulher que conseguisse fazer tanta lambança para comer um simples cachorro quente. Então você me olhou e nossos olhos se cruzaram. Eu não sei como, não sei nem mesmo explicar, mas naquele momento eu soube que você era a mulher da minha vida, e daquele instante em diante, joguei a cautela de lado e me entreguei ao que tínhamos. Enfim, faça o que tem que fazer Re.
_Quero que você me conte, como foi saber o tempo todo que você transava com a filha do homem que seu pai arruinou, pois você sabe, o maldito do seu pai acabou com a minha família inteiro com uma só bala, minha família ficou destruída. Como você se sente sabendo que tem o sangue do cara que tornou minha vida um inferno? Que destruiu todos meus sonhos.
_Eu sabia que meu pai era esse assassino cruel e frio, só que eu não podia mudar isso, ele me avisara de você, pois soube que estava rondando procurando por informações sobre ele, mas, infelizmente, ele morreu antes que você pudesse fazer o serviço. Então você veio a mim, pretendendo fazer com a minha família exatamente o que fizemos com a sua, o que espera com isso? Sentir-se vingada? Realizada?
_Não sei, não parei pra pensar nisso, só sei que deve ser feito. Meus sentimentos não importam, nunca importaram, para ninguém.
_Para mim importam. Você sabe.
_Me diz Gabriel, como posso amá-lo como amo, se todo o ódio e raiva que habitam em mim são direcionados a você? Se tudo o que sempre desejei foi matá-lo?! Não há futuro para nós, nunca houve.
_Não seja idiota e melodramática, claro que tem.
Ele levantou-se e dirigiu-se a ela que estava com a arma frouxa nas mãos, já sem mira e com os olhos totalmente enevoados pelas lágrimas que ela não se permitiu derramar.
Ela sentia seu coração pulsando, num compasso desesperado e frenético. Ela devia tomar uma atitude logo, antes que pudesse mudar de ideia, mas ela já não estivera a um passo de mudar de ideia várias vezes desde que começara essa missão idiota? Porque ela não podia simplesmente mudar de ideia e ser feliz uma vez na vida, sepultar o passado, se fosse preciso ela poderia por flores em seu tumulo, mas o passado já havia sido seu presente por tempo demais, era hora de matá-lo. Matar a coisa certa, aquilo que a sangrava.
Ela estava tão compenetrada que não notou ele aproximar-se, por isso, num susto, disparou o tiro que mudaria tudo, a bala que ela guardara por tanto tempo e que sempre tivera esse destino, e que, no entanto agora ela queria que não tivesse sido usada.
Por um momento ela realmente acreditou que o havia acertado, mas no momento seguinte ela deu-se conta que seus braços estavam levantados e por isso ela não o acertara, e sim o teto.
Ainda atordoada, ela olhou para Gabriel, sem saber o que sentir ou pensar. Os olhos dele eram como dardos que lançavam fogo sob ela, sempre foram, mas ela nunca os havia sentido como naquele momento.
Ele a beijou com fúria e desespero, jogando a arma de suas mãos para um canto esquecido do quarto preparado exclusivamente pras núpcias deles, ela pulou no colo dele e devorou cada centímetro do rosto dele, beijando cada parte que podia alcançar, ela amava esse homem. “Como pode pensar em matá-lo? Como?”
Ele a jogou na cama sem um pingo de delicadeza e arrancou dela cada peça de roupa com os dentes e os dedos furiosos, ela sentia que teria hematomas no outro dia, mas não se importava nenhum pouco. Desesperadas as bocas se procuravam enquanto ele deslizava para dentro de seu corpo completando-a como sempre fizera. Ele a apertava e mordia enquanto ela o unhava embebida pelo prazer que ele a proporcionava.
Ela nem mesmo podia lembrar-se porque diabos deveria matá-lo, não lhe parecia correto, nem possível afastar-se dele tendo a sua respiração tão quente sob seu corpo e sua boca tão saborosa em contato com a dela.
Renata não sabia como seria o dia de amanhã, ou como eles poderiam viver em harmonia agora que suas mascaras haviam caído, e as verdades foram escancaradas, mas ela  tinha a certeza plena e absoluta de que valeria a pena, contando que o tivesse junto dela pelo máximo de tempo possível.
Mas é claro, ela manteria sua 38 carregada e pronta para uso caso o ódio resolvesse suplantar o amor novamente, o que ela esperava não acontecer, mas, nunca se sabe, afinal uma mulher precavida, vale por 10.

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