Gula
Enquanto você procura de todas as formas imagináveis um corpo perfeito, ele te tenta no ócio a buscar aquele delicioso e irresistível prazer de fácil alcance. Mas se ele já não te inspira esse anseio, a quem você culpa por seus deslizes gastronômicos?
Pela manhã do sexto dia a Gula
adoeceu, ou melhor, o Gula, já que apesar do nome feminino o glutão era um
homem, baixinho e obeso, de olhos roliços e monocelha.
Naquele fatídico dia, Gula
apesar de lhe levarem os mais diversos e deliciosos pratos não possuía apetite
algum e quando, por protesto a sua infeliz condição, cometeu o erro de
obrigar-se a ingerir algo, botou até os bofes pra fora, junto de lágrimas
salgadas e infindáveis.
Todos da casa foram amontoar-se
no quarto do pobre, que era muito querido por todos eles, já que, contando que
sempre tivesse comida ao alcance de seus dedos roliços, era portador de uma
personalidade de veras amável e encantadora.
Os sete, excetuando o belo
Orgulho, choravam copiosa e infelizmente suas pitangas, cada um e todos por
suas próprias e compartilhadas dores.
Parecia um circo de horror, a
histeria era tanta que Orgulho, com modos de quem não quer nada, partiu em
direção a casa da Ardilosa “para tomar uma bebida” e “fazer-lhe companhia”.
A Morte, compreendendo o que ele
desejava em silencio, sem se atrever a verbalizar seu pedido, disse-lhe que “não
podia ajudá-los” e recomendou-lhe que fizesse um 0800 pro escritório celestial
e agenda-se uma entrevista domiciliar com algum dos anjos de plantão.
Cabisbaixo e solitário o Orgulho
saiu da casa da bela temida por todos e dirigiu-se ao carvalho partido pela
tempestade. De lá fez a ligação para um anjo, colega de bar deu, que
trabalhava, por acaso, no escritório celeste.
A conversa foi rápida, pois a
situação era gravíssima, mas o escritório só poderia enviar alguém para
averiguar a coisa toda, no dia seguinte.
A essa altura a noite já descia
pesarosa, seus negros e densos panos, sobre a casa sétima. Abalado, o inabalável
Orgulho, abalado dirigiu-se ao seu quarto para “encher a cara”.
-Equilíbrio! Ao inferno com essa
merda hic. Malditos anjos...
Do outro lado da casa, em um
quarto soberbamente recheado de mini-geladeiras que as pessoas de “catiguria”
chamam de frigobar, os 6 exuberantes paspalhos amontoavam-se aos choros, ainda
reclamando suas pitangas, que pareciam não ter fim.
E naquela noite na Terra,
ninguém repetiu a janta ou atacou a geladeira durante a noite.
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